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Esse espírito deve fazer vibrar todos os momentos vividos em um casamento. Vamos mencionar o diálogo, como exemplo do que acabamos de dizer. Se uma pessoa só busca suprir os próprios interesses, sem se interessar pelas necessidades e sentimentos dos outros, inevitavelmente irá fracassar.
O amor humaniza, torna as pessoas mais humanas. O egocentrismo animaliza. O amor humaniza. As grandes pessoas, que não são necessariamente as que estão retratadas em monumentos ou com seus nomes escritos sobre peças de bronze, muitas vezes, escondem ideologias que hoje são exaltadas mas que amanhã causarão destruição. Um grande homem e uma grande mulher se medem pela sua capacidade de amar, de buscar que os outros sejam felizes.
Preciso de você porque te amo, mas nunca te amei porque precisava de você. O amor verdadeiro é profundo, brota das entranhas do coração; o falso amor é uma caricatura, um amor envernizado, conveniente... Certa vez uma pessoa com mais de quarenta anos de casamento me disse “depois de tantos anos já posso me divorciar”. Qual o sentido deste amor, então? É impossível se aposentar do casamento, da alegria, do entusiasmo, do amor que é apaixonado por fazer o outro feliz. Enquanto essa peregrinação terrena durar, o coração irá bater no ritmo da vida e buscar sempre a felicidade. A maior sabedoria do ser humano é transformar a vida em amor e o amor em felicidade, doando-se a quem se ama.
“Você me ama porque precisa de mim ou precisa de mim porque me ama? Te amo porque preciso de você ou preciso de você porque te amo?”. Se houver algo para desenterrar, desenterrem... Se houver muito ainda a ser dito, digam-se...
Permitam-me finalizar com uma frase que parece desconectada, mas que no fundo tem ligação
com o tema: Deus é amor e nos criou para que sejamos felizes.
Para conversar em casal
1.- O que encontrei em você que me fez te amar e te escolher como marido/esposa?
2.- Te amo porque preciso de você ou preciso de você porque te amo? Você me ama porque precisa de mim ou precisa de mim porque me ama?
3.- Por que você me ama? E por que eu te amo?
4.- O que sinto ao compartilhar este tema com você?
5.- Geralmente aqueles que dizem que amam estão buscando a felicidade do amado ou a própria?
Para orar juntos
Senhor Jesus,
que nos amaste sem interesse algum,
buscando levar a salvação e a felicidade eterna
a cada um de nós,
te pedirmos como saber amar da mesma maneira,
sem nenhuma condição,
e sim doando-nos inteiramente a quem amamos de verdade.
É nosso desejo trabalhar constantemente
pelo bem do nosso amado,
nos uniste para construir a felicidade
durante os anos que ficarmos juntos,
e que se projetarão na eternidade,
ajude-nos para que isso se torne realidade.
Amém.
‘Eu’ e ‘Você’: a dinâmica do amor
“E Deus criou o homem a sua imagem;
à imagem de Deus o criou;
homem e mulher”
(Gênesis 1,27)
O ser humano foi feito para o encontro. Ele precisa do outro, deseja doar, principalmente doar a si mesmo. “Suas afeições moveriam minha demanda, se elas fossem para mim, e você, minha”1 . Dante, em uma expressão ousada, nos revela a dinâmica do ‘eu’ e ‘você’, a capacidade de sair de si mesmo e ir de encontro ao outro, que se revela decisiva para o amadurecimento de uma pessoa e da sua saúde psicológica. Os afetos do outro são exigidos e, ao mesmo tempo, oferecidos.
Durante a paixão, a aparição surpreendente do “outro” desperta o ‘eu’, sem com isso reduzir a sua personalidade. Pelo contrário, o encontro com o “outro” potencializa a própria identidade e realça o ‘eu’.
Desde o começo da própria existência, em todas as culturas e latitudes o ‘eu’ sente uma motivação e um chamado que o empurra ao encontro com do ‘eu’ com o “outro”, o que se acentua com a paixão. Essa busca é um traço marcante da natureza humana.
A Palavra de Deus nos mostra que nos primórdios houve uma definição inconfundível: um ‘eu’ é o homem e o outro ‘eu’ é a mulher. Os dois são chamados a viver um encontro profundo que transcende todos os sonhos e ilusões que alguém poderia imaginar. O amor que surge deste encontro gera um novo amor maravilhoso. Gera o “outro”, o filho.
O ‘eu’ nasce sempre de uma relação. Ninguém pode criar a si mesmo. Cada um deve sua origem a “outros”, ao pai, à mãe e a “Outro”, que é Deus.
Para que haja realização pessoal também é preciso que haja um “outro”. Ninguém é uma ilha e não existe ‘eu’ sem que haja uma relação com o “outro”. Ninguém pode ser feliz sendo sozinho e ilhado.
Lembro que certa vez, há alguns anos, fui a uma exposição de máquinas e eletrônicos e, em meio a tudo isso, havia uma jovem dentro de uma vitrine, que simulava uma casa. Lá havia uma cadeira, um banheiro e um computador mas ela estava incomunicável com tudo ao seu redor. Quando alguém se aproximava do seu stand, essa pessoa mal sorria, mas demonstrava aos outros que conseguia resolver “todas” as suas necessidades com um computador. Essa jovem estava “encapsulada”. Ou melhor, ela procurava demonstrar que com um computador era possível resolver tudo, mas não havia realmente uma interação entre as pessoas e ela. A vida não pode ser resolvida “à distância”. É muito diferente buscar o pãozinho na padaria, escolhê-lo e ao final ser atendido pelo próprio padeiro que o amassou, sovou e serviu. Sair de casa e se relacionar implica em muitas coisas, como encontrar as pessoas na rua e comentar “que calor”, “como choveu”, “como estão seus filhos?”, “você superou aquele problema de saúde?”, “que bom te ver”... enfim, temas que fazem parte do dia a dia e que possibilitam relações entre as pessoas. O individualismo convida cada um a ter a sua própria vitrine, mas nós somos pessoas capazes de se relacionar, de abrir o coração e a mente, de nos comunicar uns com os outros.
Como vemos, a experiência com o outro nos relembra constantemente da vida em si. Pensemos em um bebê, quando ele olha fixamente o rosto de sua mãe ao descobrir que ela está sorrindo; no alívio de uma criança que diante de um medo encontra conforto na mão do próprio pai; na sensação do adolescente que troca um olhar de cumplicidade com quem está apaixonado; na companhia de amigos que se sentam e contemplam juntos uma bela paisagem; no milagre daquele homem chileno que foi “esmagado” contra um caminhão e que foi dado como morto, mas sua esposa, vendo um pouco de sangue escorrer no acidente, insistiu que estaria vivo e depois de seis meses de terapia intensiva ele abriu os olhos, encontrando-a ao seu lado, incondicionalmente, pois havia vendido todos os bens que tinham para poder pagar os seis meses de hospital e de esperança que ela tivera; na última frase que meu pai me disse ao ouvido; no olhar e no sorriso da minha mãe antes de partir... enfim, o outro é incondicionalmente necessário em nossas vidas.
Ninguém pode ser autossuficiente e viver preso em si mesmo. O ‘eu’ abre os olhos da vida e se realiza por meio de uma atração pelo “outro” de uma maneira impressionante e irresistível. O amor em todas as suas dimensões fala desta experiência universal que afeta todos os seres humanos, de diferentes latitudes e culturas, através dos tempos. Embora a palavra amor tenha sido banalizada, no fundo ela faz parte de uma experiência invencível.
Um encontro atende à criação, na qual Deus fez o ser humano, o homem e a mulher, dando-lhes a oportunidade de se relacionarem, comunicarem, amarem, atendendo assim ao propósito pelo qual foram criados à Sua imagem e semelhança. Ser homem e ser mulher é uma das manifestações mais importantes da criação, uma oportunidade muito especial, assim como viver o amor entre ambos é um presente, um dom que se coroa com a fecundidade. O sexo “desconectado” da fecundidade e da paternidade nos levou ao problema fictício do gênero. Ao subtrair o amor do sexo e a continuação da vida, qualquer “prazer” se torna válido, levando as pessoas a se fecharem cada vez mais em si mesmas. Deus fez o ser humano como alguém capaz de se abrir e ir de encontro ao outro, de tecer sua vida através de uma maravilha que transcende as próprias vidas, fazendo-se filho.
“E Deus disse: não é bom que o homem esteja só, farei para ele alguém que o auxilie e corresponda” (Gênesis, 2, 18). Todas as células partem daí, masculinas e femininas, complementando-se para que os grandes projetos de vida e o fruto se realizem e sejam felizes.
A dinâmica do amor matrimonial se dá necessariamente no encontro do ‘eu’ pessoal e do ‘outro’. Não se pode viver um casamento por meio de um computador, de redes sociais ou do celular... Mesmo a sociedade atual tendo chegado a esse ponto... Alguns parceiros tem até que disputar a atenção do próprio cônjuge frente ao desejo de estar em uma vitrine virtual, conectado anonimamente com muitas pessoas e, por conta disso, muitos se esquecem do carinho, da escuta e da atenção que seu verdadeiro esposo ou esposa precisa.
Deixo aqui algumas palavras para finalizar esta reflexão que sugiro ser feita de mãos dadas: “Eu sou porque ‘você’ é e você é para mim porque ‘eu’ sou para ti. Dizer ‘você’ aqui significa erguer uma ponte infinita, uma ponte de luz que tem a força a sustentar ‘você’ e ‘eu’. Eu vou até você e você vem até mim.” (Lippert).
Para conversar em casal.
1.- ¿Recordamos el momento en el cual el otro comenzó a ser un ‘tú’ que sorprendió al ‘yo’? Narrarlo mutuamente.
2.- ¿Nos regalamos el suficiente tiempo para el encuentro de nuestros ‘yo’ y ‘tú’?
3.- ¿Existe algún aspecto en los que nuestros ‘yo’ viven en vitrina? ¿Cómo mejorar en este sentido?
4.- El individualismo que quiere imponer nuestra sociedad, ¿permite descubrir al ‘tú’? Los jóvenes, ¿tienen posibilidades de salir de su ‘yo’ frente a las propuestas sociales?
5.- ¿Cómo trabajar en la educación de las nuevas generaciones para que puedan descubrir el ‘tú’ del otro?
Para orar juntos.
Senhor Jesus,
em Tua própria experiência do mistério da Trindade
se encontra a dinâmica do ‘EU’ e do ‘VOCÊ’,
por isso, te pedimos que nos ajude
a fortalecer nosso encontro,
que aquela primeira vez em que começamos
a sentir o outro dentro de nós,
seja uma constante motivação para crescer
e ir entrelaçando nossos ‘eus’,
formando assim um maravilhoso ‘nós’.
Também desejamos aprofundar
a busca por ‘Você’, Senhor,
que está no meio de nós,
para que nós dois
nos entreguemos plenamente a Ti.
Amém.
1. Dante Alighieri, Divina Comédia, Paraíso IX, Losada Buenos Aires 2004, pág. 414
Você enche meu coração de alegria
“Como você é linda, minha amada, como você é linda!
Teus olhos são como pombas!
Como você é lindo, meu amado,
você é tão encantador!
As flores sobre a terra foram apreciadas,
chegou o tempo das canções e ouviu-se
na nossa terra o cantar dos passarinhos.
A figueira deu seus primeiros frutos
e as vinhas em flor exalaram seu perfume.
Levante-se, minha amada, minha linda!
Meu passarinho, que se aninha entre as fendas
das rochas e nas escarpas, mostre-me o seu rosto,
deixe-me ouvir a sua voz; porque sua voz
é suave e seu semblante é lindo.”
(Cantar dos Cantares 1, 15-16; 2, 12-14)
Coração Contente (Palito Ortega)
Você é o mais belo
da minha vida,
mesmo que eu não te diga,
mesmo que eu não te diga.
Se você não está aqui
não tenho alegria,
sinto sua falta à noite,
e sinto sua falta de dia.
Gostaria que soubesse
que nunca amei assim,
que minha vida começou
quando te conheci.
Você é como o sol
da manhã,
que entra pela minha janela,
que entra pela minha janela.
Você é a alegria da minha vida,
o sonho da minha noite,
a luz dos meus dias.
Meu coração está contente,
o coração está contente,
cheio de alegria.
Meu coração está contente
desde o momento
em que chegaste até mim.
Dou graças à vida
e peço a Deus
que você nunca me falte,
gostaria que soubesse
que nunca amei assim
que minha vida começou
quando te conheci
Escutei esta música previamente e a propondo-a como reflexão, e meu desejo que ela lembre o quão importante cada um de vocês é para o outro. Sinto muita dor quando percebo a tristeza em um casa-mento e no âmago da intimidade daqueles que se amam.
“Minha vida começou quando te conheci”. Cada um pode dizer ao outro: “quando Deus colocou você em minha vida ‘apareceram as flores sobre a terra, chegou o tempo das canções e ouviu-se em nossa terra o cantar dos passarinhos. A figueira deu seus primeiros frutos e as vinhas em flor exalaram seu perfume”. A vida comelou a pulsar e a sentir que um novo horizonte se abria.
“Você é o mais belo da minha vida, mesmo que eu não te diga”. Nos muitos anos trabalhando com casamentos, encontrei poucos casais que de fato não se amavam; mas já me apareceram muitos casais que não demonstravam que se amavam entre si, como também não o demonstravam aos demais. A rotina e os hábitos do cotidiano influenciavam o casamento, além do desgaste natural que acontece na convivência entre duas pessoas diferentes. Por isso é tão importante que os parceiros reconheçam um ao outro e que relembrem que encontrar-se foi o melhor que já lhes aconteceu na vida. Neste mo-mento, convido vocês a relembrarem os velhos tempos, o entusiasmo que a paixão gerava e a decisão de ser o amado um do outro, por toda a vida.
“Se você não está aqui não tenho alegria, sinto sua falta à noite e sinto sua falta de dia. Gostaria que soubesse que nunca amei assim”. Como seria diferente se o amor que vocês têm sempre fosse destinado um ao outro? Ao se unirem vocês celebraram o maior e único bem que possuem: a vida. O dom maravilhoso da vida que Deus lhes presenteia dura até quando Ele permite e ao consagrá-lo ao amado ou amada, ele é único e insubstituível. O amor leva a uma profunda união entre ambos, a ser uma “só carne”, e isso significa muito mais do que a união de dois corpos, significa a união entre duas pessoas, seus corpos e espíritos. Isso pode implicar em uma sensação que pode levá-los a sentir a ausência profunda um do outro quando um dos dois estiver distante, pois longe, a vida perderá o sentido e a própria alegria de viver.
O amor lhes deu a oportunidade de sair do ‘eu’ para encontrar-se no ‘eu’ que existe no outro. A crise que muitos casamentos enfrentam hoje em dia é - em parte - fruto do individualismo que a sociedade atual planta nas pessoas, impedindo-as de encontrarem-se com o “outro”. Quando surge uma pequena ou grande crise no casamento, ela geralmente se manifesta na atitude fechada de uma das partes, enquanto o outro lamenta-se ou aponta as falhas e feitos que anteriormente não incomo-davam a vida a dois, ambos culpando um ao outro pela situação que estão enfrentando. Neste mo-mento o casamento perde a alegria. Em contrapartida, quando se busca o ‘outro’ saindo da esfera do ‘eu’, busca-se constantemente construir o ‘nós’, e nesse caso tudo é diferente, pois um clima de felicidade se cria e ambos contribuem doando a parte mais positiva e maravilhosa de si mesmo e balanceando aquilo que falta ou sobra no casal. O amor tudo pode. Ele aguenta, suporta e carrega as dificuldades do parceiro. Conheço uma esposa que, quando seu esposo fazia algo que não lhe agrada-va, ela saia de casa de carro atrás dele, tomando conta para que ele não fizesse alguma bobagem. Ao invés de repreender, ela amava cuidando. O amor pode muito mais, sempre!
“Meu coração está contente desde o momento em que chegaste até mim. Dou graças à vida e peço a Deus que você nunca me falte”. Deus quis que a vida dos dois se entrelaçasse. Não é este um motivo de alegria? Que maravilha é ver dois esposos que, ao se olharem nos olhos, brilham de felicidade!
Um casamento feliz gera uma sensação indescritível para os esposos, que presenteiam a segurança a seus filhos e, acima de tudo, propiciam que eles cresçam em uma família sólida que, por sua vez, despertará neles o desejo de construir uma família semelhante. Um casamento feliz gera uma família feliz. A felicidade de uma família captura a atenção de quem os observa mas também dos seus próprios membros, pois desperta em todos os integrantes que, por algum motivo precisaram se ausentar, o desejo de voltar para casa.
Uma família feliz é o sonho de Deus, o sonho de todos os noivos que estão prestes a se casar, o sonho dos esposos que dia após dia constroem sua vida no lar, o sonho dos filhos quando projetam no futuro a realidade que experimentaram dentro de casa. É para a família feliz que o Hogares Nuevos (Novos Lares) trabalha e evangeliza. Que todos os esposos sejam capazes de celebrar o testemunho belo e profundo de um coração contente e cheio de alegria. Por isso, deem graças à vida e a Deus e peçam que o outro nunca venha a faltar, mas sim que a felicidade que hoje vocês experimentam se projete por toda a eternidade.
Digam estas palavras hoje e sempre, como preferirem ou com as palavras do Cantar dos Cantares: “Como você é linda, minha amada, como você é linda! Como você é lindo, meu amado, você é tão encantador!”.
Para conversar em casal.
1.- Digam um ao outro o quanto cada um importa para si.
2.- Em relação ao casamento: vocês estão contentes e felizes um com o outro? Vocês tem um casa-mento feliz? Que aspectos estão dispostos a nutrir para que a felicidade do casamento cresça cada vez mais?
3.- Pensem e realizem um convite mútuo para comemorar as alegrias que estão em seus corações por ter alguém ao seu lado.
4.- Nossa sociedade lhe ajuda a valorizar o seu parceiro? Quais são os riscos concretos que existem na desvalorização social da vida de casado e como isso pode afetar os casamentos hoje em dia?
Para orar juntos.
Senhor, toma-nos pela mão,
queremos-Te agradecer
por ter nos unido no caminho da vida,
dando-nos a oportunidade de ser felizes
em nosso casamento e na família.
Desde que nos chamaste a construir uma família,
somos muito contentes,
nosso coração transborda de alegria,
somos felizes.
Ajude-nos a basear nossa família em Tua fortaleza,
que nunca nos falte a graça,
para que até o final dos nossos dias,
possamos desfrutar da beleza
do nosso casamento e da família.
Amém.
Devo cuidar de você e não você de mim
“Façam aos outros o que querem
que eles façam a vocês.”
(Mateus 7,12)
Certa vez tive uma experiência que, de alguma forma creio todos já terem vivido, que me levou a uma reflexão que hoje quero compartilhar.
Em seus últimos três meses de vida, quando trouxe minha mãe para viver comigo, me dei conta de que lhe faltavam algumas roupas para se vestir. Fui comprá-las pessoalmente em uma cidade a 30 quilômetros da minha casa. Na primeira loja em que entrei, uma senhorita me atendeu com muita ternura e quando fui pagá-la, ela disse: “Leve as roupas e se elas derem certo, o senhor me paga, senão pode devolvê-las”. E assim aconteceram algumas vezes. Um tempo depois, fui a uma loja de sapatos (precisava de um número maior), paguei-os e levei-os. Não serviram, eu os troquei e devia pagar a diferença, mas o senhor que me atendeu disse: “Não precisa”. Em ambos os lugares as pessoas não sabiam quem eu era, o que fazia nem aonde vivia. Em um dos lugares só sabiam que meu nome era Ricardo, mais nada...
Nos dias em que fui pagar, agradeci... E fui embora caminhando em silêncio. Neste momento surgiu a reflexão que hoje quero compartilhar com vocês.
Não podemos negar a presença do pecado original na humanidade. Mas, que belo mundo construiría-mos se o amor fosse a motivação de toda ação! Que famílias viveriam os dias de hoje!
Quando o amor é uma realidade, todos sentem que as pessoas cuidam umas das outras, e não que os outros deveriam cuidar delas. “Devo cuidar de você e não você de mim”. Como seria bom se todos nós cuidás-semos uns dos outros e deixássemos de interferir na vida dos outros. Me escandalizei quando vi pela primeira vez o tráfico na Colômbia, na difícil Medelín dos anos 80. Hoje vemos isso em todos os lugares da nossa América Latina. Vive-se com medo e temor. Muita gente vive com desconfiança do outro. Alguns amigos da Obra não só foram assaltados, como também caíram nas mãos de sequestradores, chantagistas e foram vítimas de pressão psicológica. Diante disso, como não desconfiar! Traduzindo essa situação, muitos de nós diriam: quantos corações são levados pela desconfiança e pelo medo de serem invadidos!
Quando alguém empresta generosamente dinheiro, uma ferramenta ou um livro, quase sempre quem empresta anota em algum lugar o empréstimo, para que não se esqueça, mas deveria ser diferente. Quem deveria anotar o empréstimo é aquele que recebe, para que se lembre e cuide bem das coisas dos outros.
Certa vez, um casal muito estimado me falava sobre seu filho, dizendo que ele tinha comportamentos que eles não entendiam. Por exemplo, o casal separava todas as atividades, designando cada atividade ou ao esposo ou à esposa. Um dia a responsabilidade era dele, no outro, da esposa. Parecia mais um contrato de convivência do que um marido e mulher que realmente se amavam. Entre humanos nunca foi assim. Ao amar-nos, cada um se dispõe a ajudar o outro, a cuidar do outro”. Cada um cuida do outro por amor, mas em relacionamentos por conveniência e sem amor, tudo se dá por convenções e difíceis acordos que surgem a partir do egoísmo.
Tudo isso soa estranho para o mundo atual. Por curiosidade procurei saber se alguém já havia dito a frase-título deste capítulo e pesquisei na internet “devo cuidar de você e não você a mim”, e a pesquisa, por sua vez, me resultou em: “Talvez você queira dizer: você deve cuidar de si e não de mim”. Essa frase é algo muito coerente com o que se escuta tanto hoje em dia: “cuide do seu que eu cuido do meu”; “dedique-se a si mesmo”, “devo pensar mais em mim”. Vivemos em um mundo cheio de individualismo! E vivemos em meio a uma geração na qual muitos se tornam incapazes de amar.
Voltemos à realidade da família. Em muitos lares vive-se como se a casa fosse um simples espaço de convivência, onde os membros conhecem uns aos outros, tem um vínculo matrimonial ou familiar, no caso dos filhos, e no qual cada um deve tomar cuidado para não ser invadido em seu espaço, nem invadir o espaço do outro, para que isso não gere conflitos nem desavenças que possam afetar a paz “fictícia” que se alcançou. Isso é falta de amor!
Por outro lado, a insistência em pensar apenas em si mesmo gera enormes ‘eus’ que constantemente se chocam uns com os outros porque nunca levam em consideração algo que vá além de si mesmo. A incapaci-dade de amar não lhes permite perceber o outro, suas necessidades e seus carências. Assim temos esposos que não são cuidados pelas esposas. Esposas esquecidas pelos esposos. Pais que dão de tudo para seus filhos, contando que não os incomodem... a solução que se encontra é sempre genérica. “Devo cuidar de você e não você de mim”. Essa premissa se relaciona diretamente com a regra de ouro do evangelho “façam aos outros o que querem que eles façam a vocês”.
Quando é conveniente, quantos não exigem o que nunca fizeram pelo outro! Nunca serviram e exigem serem servidos! Nunca se disponibilizaram, mas quando é a vez deles, tudo tem que ser para “agora”. E tantos outros exemplos...
É preciso treinar viver o amor em todos os lares. Assim cada um poderá cuidar do outro, ao invés de se defender do outro. Cada membro da família deve buscar agir com o outro como gostaria que os outros agissem consigo. Dessa maneira, em cada lar estaremos construindo um mundo novo.
Para conversar em casal.
1.- Em nossa vida de casados (familiar), sentimos que cada um cuida do outro?
2.- Existe algum traço de desconfiança entre nós?
3.- O que cada um espera do outro para se sentir mais cuidado?
4.- Em um mundo individualista, egoísta e vaidoso, o quanto somos diferentes? Somos confiáveis? Ou estamos submersos na mesma postura do mundo?
5.- Nos dispomos a cuidar dos demais como gostaríamos de ser cuidados pelos outros?
6.- Em nossa família existe a compreensão de que devemos cuidar dos outros como verdadeiros tesouros de Deus?






