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A Jilly parece bem, Pensou.
Jilly era uma menina magra e de pele escura – mas já não a rapariguinha desesperada que Riley salvara das ruas de Phoenix há alguns meses atrás. Era amável e saudável, e parecia estar a ajustar-se bem à nova vida com Riley e a família.
E April estava a provar ser uma excelente irmã mais velha. Estava a recuperar bem de traumas por que tinha passado.
Por vezes quando olhava para April, Riley sentia que estava a olhar para um espelho – um espelho que mostrava o seu próprio eu adolescente de há muitos anos atrás. April tinha os olhos cor de avelã e cabelo escuro de Riley.
Riley sentiu uma imensa tranquilidade.
Talvez esteja a fazer um ótimo trabalho como mãe, Pensou.
Mas a tranquilidade depressa se dissipou.
O misterioso Assassino da Caixa de Fósforos ainda assombrava a sua mente.
*
Depois do jantar, Riley foi para o seu quarto e escritório. Sentou-se ao computador e respirou fundo algumas vezes, tentando relaxar. Mas a tarefa que estava à sua espera era de alguma forma angustiante.
Parecia ridículo ela sentir-se daquela forma. No final de contas, ela perseguira e combatera dezenas de assassinos perigosos ao longo dos anos. A sua própria vida tinha estado ameaçada mais vezes do que o razoável.
Só falar com a minha irmã não me devia deixar assim, Pensou.
Mas não via Wendy há… quantos anos já tinham passado?
Pelo menos desde que Riley era miúda. Wendy entrara novamente em contacto quando o pai de ambas morrera. Tinham falado ao telefone refletindo na possibilidade de se encontrarem pessoalmente. Mas Wendy vivia longe em des Moines, Iowa e não tinham conseguido combinar um encontro. Então tinham decidido daquela vez falarem através de um chat de vídeo.
Para se preparar, Riley olhou para uma foto emoldurada que estava à sua secretátia. Tinha-a encontrado entre os pertences do pai após a sua morte. Mostrava Riley, Wendy e a mãe. Riley parecia ter quatro anos e Wendy já devia estar na adolescência.
Ambas as raparigas e a mãe pareciam felizes.
Riley não se lembrava quando ou onde a fotografia fora tirada.
E não se recordava da sua família alguma vez ser feliz.
Com as mãos frias e a tremer, digitou a morada de vídeo de Wendy no teclado.
A mulher que surgiu no ecrã bem podia ser uma perfeita estranha.
“Olá Wendy,” Disse Riley timidamente.
“Olá,” Respondeu Wendy.
Ficaram ali sentadas a olhar uma para a oura estupidamente durante alguns momentos confrangedores.
Riley sabia que Wendy tinha cerca de cinquenta anos, sendo por isso dez anos mais velha que ela. Parecia encarar a idade que tinha sem problemas. Parecia bastante convencional. O cabelo parecia não estar a encanecer como o de Riley, mas Riley duvidava que fosse a sua cor natural.
Riley olhava para o rosto de Wendy e para a foto. Notou que Wendy se parecia com a mãe. Riley sabia que se parecia mais com o pai e não se sentia especialmente orgulhosa dessa parecença.
“Bem,” Disse por fim Wendy para quebrar o silêncio. “O que é que tens feito… nas últimas décadas?”
Riley e Wendy riram-se ambas um pouco. Até o seu riso parecia tenso e estranho.
Wendy perguntou, “És casada?”
Riley suspirou alto. Como podia ela explicar o que se estava a passar entre ela e Ryan quando nem ela sabia ao certo?
Disse, “Bem, como os miúdos dizem hoje em dia, ‘é complicado’. E quero dizer mesmo complicado.”
Seguiram-se mais uns risos nervosos.
“E tu?” Perguntou Riley.
Wendy parecia começar a descontrair um pouco.
“O Loren e eu estamos quase a fazer vinte e cinco anos de casados. Somos ambos farmacêuticos e temos a nossa própria farmácia. O Loren herdou-a do pai. Temos três filhos. O mais novo, Barton, está fora na universidade. Thora e Parish são ambos casados e têm as suas vidas. Acho que isso faz de mim e do Loren os clássicos pais cujos filhos ganharam asas e os deixaram.”
Riley sentiu uma melancolia estranha a tomar conta dela.
A vida de Wendy em nada se tinha assemelhado à dela. Na verdade, a vida de Wendy tinha sido aparentemente normal.
A sensação de estar a olhar para um espelho, como ao jantar com April, regressara.
Com exceção de que o espelho não era do seu passado.
Era de um ser futuro – alguém em quem ela se poderia ter transformado, mas que nunca, nunca poderia ser.
“E tu?” Perguntou Wendy. “Tens filhos?”
Mais uma vez Riley sentiu-se tentada a dizer…
“É complicado.”
Mas em vez disso, disse, “Duas. Tenho uma filha com quinze anos, April. E estou prestes a adotar outra – Jilly que tem treze anos.”
“Adoção! Mais pessoas o deviam fazer. Isso é ótimo.”
Riley não sentia que devia ser parabenizada no momento. Sentir-se-ia melhor se tivesse a certeza de que Jilly cresceria numa família com pai e mãe. Naquele momento, aquele assunto era uma dúvida. Mas Riley decidiu não entrar por aí com Wendy.
Em vez disso, queria tratar de um outro assunto com a irmã.
E receava que pudesse ser estranho.
“Wendy, sabes que o pai me deixou a sua cabana no testamento,” Disse ela.
Wendy anuiu.
“Eu sei,” Disse ela. “Enviaste-me algumas fotos. Parece um lugar agradável.”
As palavras eram um pouco dissonantes…
“… um lugar agradável.”
Riley tinha lá estado algumas vezes – e recentemente quando o pai falecera. Mas as suas memórias do lugar estavam longe de ser agradáveis. O pai tinha comprado quando se aposentara da Marinha. Riley lembrava-se da cabana como a casa de um velho solitário e mau que odiava toda a gente – e um homem que também todos odiavam. A última vez que Riley o vira vivo, haviam chegado a vias de facto.
“Penso que foi um engano,” Disse Riley.
“O quê?”
“Deixar-me a cabana. Foi errado da parte dele fazer isso. Devia ter ido para ti.”
Wendy parecia genuinamente surpreendida.
“Porquê?” Perguntou.
Riley sentiu todo o tipo de emoções negativas a revolverem-se dentro de si. Aclarou a garganta.
“Porque estiveste com ele no fim, quando ele estava no lar. Cuidaste dele. Até trataste de tudo depois de ele morrer – o funeral e as coisas legais. Eu não estava lá. Eu…”
Riley quase se engasgou com as palavras que proferiu de seguida.
“Penso que não conseguiria fazer o que fizeste. Nós não nos dávamos bem.”
Wendy sorriu com tristeza.
“Nós também não nos dávamos bem.”
Riley sabia que era verdade. Pobre Wendy – o pai batera-lhe regularmente até ela finalmente fugir de vez aos quinze anos. E mesmo assim, Wendy mostrara a decência de cuidar dele no fim.
Riley não o tinha feito e não conseguia evitar sentir-se culpada a esse respeito.
Riley disse, “Não sei quanto vale a cabana. Deve valer alguma coisa. Quero que fiques com ela.”
Os olhos de Wendy dilataram-se. Parecia assustada.
“Não,” Disse ela.
A franqueza da sua resposta espantou Riley.
“Por que não?” Perguntou Riley.
“Simplesmente não posso. Não quero. Quero esquecer-me dele.”
Riley sabia exatamente como é que ela se sentia. Ela sentia o mesmo.
Wendy acrescentou, “Deves vendê-la e ficar com o dinheiro. É o que quero que faças.”
Riley não sabia o que dizer.
Felizmente, Wendy mudou de assunto.
“Antes do pai morrer, ele disse-me que eras agente da UAC. Há quanto tempo estás nesse trabalho?”
“Há cerca de vinte anos,” Disse Riley.
“Bem. Penso que o pai tinha orgulho em ti.”
Um riso amargo apoderou-se de Riley.
“Não, não tinha,” Disse ela.
“Como sabes?”
“Oh, ele deu-me a entender. Ele tinha a sua forma muito particular de comunicar.”
Wendy suspirou.
“Penso que tinha,” Disse Wendy.
Seguiu-se um silêncio desconfortável. Riley não sabia do que deviam falar. No final de contas, mal tinham falado durante muitos anos. Deveriam tentar encontrar uma forma de se reunirem pessoalmente? Riley não se imaginava a viajar até Des Moines só para ver esta estranha chamada Wendy. E tinha a certeza que Wendy sentia o mesmo em relação a ela.
Afinal, o que poderiam ter em comum?
Naquele momento, o telefone de Riley tocou. Ficou grata pela interrupção.
“É melhor atender,” Disse Riley.
“Eu compreendo,” Disse Wendy. “Obrigada por este bocadinho.”
“Eu é que te agradeço,” Disse Riley.
Terminaram a chamada e Riley atendeu o telefone. Riley disse ola e depois ouviu uma voz confusa de mulher.
“Olá… quem fala?”
“Quem fala?” Repetiu Riley.
Seguiu-se um silêncio.
“O… o Ryan está em casa?” Perguntou a mulher.
As suas palavras pareciam agora distorcidas. Riley tinha a certeza de que a mulher estava bêbeda.
“Não,” Disse Riley. Hesitou durante alguns instantes. Afinal de contas, lembrou a si própria, podia ser uma cliente de Ryan. Mas ela sabia que não era. A situação era demasiado familiar.
Riley disse, “Não volte a ligar para este número.”
E desligou.
Uma fúria imensa apoderou-se dela.
Está a começar outra vez, Pensou.
Ligou para o telefone da casa de Ryan.
CAPÍTULO TRÊS
Quando Ryan atendeu o telefone, Riley não perdeu tempo a ir direita ao assunto.
“Estás a andar com outra pessoa, Ryan?” Perguntou.
“Porquê?”
“Acabou de ligar uma mulher a perguntar por ti.”
Ryan hesitou antes de perguntar, “Ficaste com o nome dela?”
“Não. Desliguei.”
“Quem me dera que não o tivesses feito. Podia ser uma cliente.”
“Estava bêbeda Ryan. E era pessoal. Percebi pelo tyom de voz.”
Ryan ficou sem saber o que dizer.
Riley repetiu a pergunta, “Estás a andar com alguém?”
“Eu… desculpa,” Gaguejou Ryan. “Não sei como é que ela conseguiu o teu número. Deve ter sido algum engano.”
Ah, podes crer que houve um engano, Pensou Riley.
“Não estás a responder à minha pergunta,” Insistiu ela.
Agora Ryan começava a ficar zangado.
“E se estiver a andar com alguém? Riley, nunca fizemos nenhum acordo de exclusividade.”
Riley ficou surpreendida. Não, ela não se recordava de terem feito um acordo desse género. Mas ainda assim...
“Eu simplesmente assumi…” Principiou ela.
“Talvez tenhas assumido demasiado,” Interrompeu Ryan.
Riley tentou contrariar o seu temperamento.
“Como é que ela se chama?” Perguntou.
“Lina.”
“É sério?”
“Não sei.”
O telefone tremia na mão de Riley.
Disse, “Não te parece que já é altura de te decidires?”
Seguiu-se um silêncio.
Por fim, Ryan disse, “Riley, tenho querido falar contigo sobre isto. Preciso de algum espaço. Toda esta cena de família – eu pensava que estava preparado para isto, mas não estou. Quero desfrutar da minha vida. E tu deves também desfrutar da tua.”
Riley conseguia discernir um tom demasiado familiar na sua voz.
Voltou ao modo playboy, Pensou.
Ele estava a saborear a sua nova ligação, afastando-se de Riley e da sua família. Ultimamente, parecia um homem mudado – mais empenhado e responsável. Ela devia ter percebido que não era coisa para durar. Ele não mudara nada.
“O que é que vais fazer agora?” Perguntou ela.
Ryan parecia aliviado por finalmente poder revelar o que pensava.
“Olha, esta coisa de andar entre a tua casa e a minha – não está a resultar para mim. Parece demasiado temporário. O melhor é ficar-me pela minha casa.”
“A April vai ficar aborrecida,” Disse Riley.
“Eu sei. Mas havemos de nos arranjar. Vou continuar a passar tempo com ela e vai tudo correr bem. Já passou por coisas bem piores.”
A loquacidade de Ryan estava a enfurecer Riley a cada minuto que passava. Estava prestes a explodir.
“E a Jilly?” Perguntou Riley. “Ela gosta muito de ti. Aprendeu a contar contigo. Ajudaste-a em imensas coisas. Como os trabalhos de casa. Ela precisa de ti. Está a passar por tantas mudanças, é tudo muito duro para ela.”
Seguiu-se outra pausa. Riley sabia que Ryan estava a preparar-se para dizer qualquer coisa de que ela não ia gostar.
“Riley, a Jilly foi uma decisão tua. Admiro-te por isso, mas não fui eu que tomei essa decisão. A adolescente problemática de outra pessoa é muita areia para a minha camioneta. Não é justo.”
Durante um momento, Riley estava tão furiosa que não conseguia falar.
Ryan regressara aos velhos tempos em que apenas os seus sentimentos importavam.
Era um caso perdido.
“Vem cá e leva as tuas coisas,” Disse ela de forma brusca. “E vem quando as miúdas estiverem na escola. Quero que tudo o que é teu desapareça daqui o mais rapidamente possível.”
E desligou o telefone.
Levantou-se da secretária e caminhou furiosamente pelo quarto.
Desejava ter um escape para a sua fúria, mas naquele momento não havia nada a fazer. Ia ter que aguentar uma noite de insónia.
Mas no dia seguinte, tomaria as providências necessárias para libertar aquela tensão.
CAPÍTULO QUATRO
Riley sabia que um ataque se aproximava e que ia ser próximo e súbito. E podia vir de qualquer lado daqueles espaços labirínticos. Esgueirou-se cuidadosamente ao longo de um corredor estreito do edifício abandonado.
Mas as memórias da noite anterior não paravam de se intrometer…
“Preciso de algum espaço,” Dissera Ryan.
“Toda esta cena de família – eu pensava que estava preparado para isto, mas não estou.”
“Quero desfrutar da minha vida.”
Riley estava zangada – não apenas com Ryan, mas também com ela por se ter deixado distrair.
Mantém-te concentrada, Disse a si própria. Tens um bandido para apanhar.
E a situação era sombria. A colega mais nova de Riley, Lucy Vargas, já tinha sido ferida. O parceiro de longa data de Riley, Bill Jeffreys, tinha ficado com Lucy. Estavam ambos a uma esquina de distância atrás de Riley, a tentar detetar atiradores. Riley ouviu a espingarda de Bill.
Com perigo à espreita à sua frente, não podia olhar para trás para ver o que se estava a passar.
“Como está a situação, Bill?” Gritou.
Agora ouvia uma série de tiros de semiautomática.
“Um abatido, faltam dois,” Gritou-lhe Bill. “Eu abato estes tipos, sem problema. E cubro a Lucy, ela vai ficar bem. Mantém os teus olhos focados no que tens à tua frente. Aquele tipo à frente é bom. Muito bom.”
Bill tinha razão. Riley não conseguia ver o atirador à frente, mas ele já tinha atingido Lucy. Se Riley não o abatesse, o mais certo era matá-los aos três.
Manteve a sua carabina M4 erguida e pronta. Há muito que não manuseava uma arma de assalto, por isso ainda se estava a habituar à sua forma e peso.
À sua frente estava o corredor com todas as portas abertas. O atirador podia estar em qualquer um daqueles compartimentos. Ela estava determinada a encontrá-lo e a abatê-lo antes que fizesse mais estragos.
Riley manteve-se junto à parede, movimentando-se na direção da primeira porta. Esperando que ele lá estivesse, manteve-se afastada da entrada, pegou na arma e disparou três vezes para o interior. Depois colocou-se à entrada e disparou mais três vezes. Desta vez pressionou a coronha contra o ombro para amparar o recuo.
Baixou a arma e viu que o compartimento estava vazio. Virou-se para se certificar que o corredor ainda estava vazio, depois pensou durante um instante sobre qual seria a sua próxima ação. Para além de ser perigoso, verificar cada compartimento daquela forma ia custar-lhe munições preciosas. Mas naquele momento, parecia não ter escolha possível. Se o atirador estivesse num daqueles compartimentos, estava preparado para matar quem tentasse ultrapassar a entrada.
Parou por um momento para avaliar as suas próprias reações físicas.
Estava agitada, nervosa.
A pulsação estava acelerada.
Respirava com dificuldade e aceleradamente.
Mas era da adrenalina ou da fúria da noite passada?
Lembrou-se outra vez…
“E se estiver a andar com alguém?” Dissera Ryan.
“Riley, nunca fizemos nenhum acordo de exclusividade.”
Dissera-lhe que o nome da mulher era Lina.
Riley perguntou-se que idade teria.
Provavelmente muito jovem.
As mulheres de Ryan eram sempre demasiado jovens.
Raios, para de pensar nele! Estava a reagir como uma novata estúpida.
Tinha que se lembrar de quem era. Ela era Riley Paige e era respeitada e admirada.
Tinha vários anos de treino e trabalho de campo.
Descera ao inferno e voltara vezes se conta. Tirara vidas e salvara vidas. Tinha sempre calma perante o perigo.
Então como podia ela deixar Ryan afetá-la daquela forma?
Abanou-se, tentando afastar as distrações da cabeça.
Dirigiu-se ao compartimento seguinte, disparou à entrada, depois entrou e disparou novamente.
Naquele momento a sua arma encravou-se.
“Raios,” Resmungou Riley audivelmente.
Por sorte, o atirador também não estava naquele compartimento. Mas ela sabia que a sua sorte podia acabar a qualquer momento. Pousou a M4 e sacou a sua pistola Glock.
Nessa altura, um movimento captou a sua atenção. Ele estava ali, naquela porta logo à frente, a espingarda apontada diretamente a ela. Instintivamente, Riley baixou-se e rebolou, evitando o disparo. Depois ficou ajoelhada e disparou três vezes, protegendo-se do recuo. As três balas atingiram o atirador que caiu no chão.
“Apanhei-o!” Gritou a Bill. Observou a figura cuidadosamente e não viu sinal de vida. Terminara.
Então Riley levantou-se e removeu o seu capacete de RV, fones e microfone. O atirador caído desaparecera, juntamente com o labirinto de corredores. Deu por si numa sala do tamanho de um campo de basquetebol. Bill estava próximo e Lucy levantava-se. Bill e Lucy também tiravam os seus capacetes. Tal como Riley usavam outros equipamentos, incluindo correias à volta dos pulsos, joelhos e tornozelos que detetavam os seus movimentos na simulação.
Agora que os seus companheiros já não eram fantoches simulados, Riley parou por um momento para apreciar a sua presença real. Pareciam um par estranho – um deles maduro e sólido, e outro jovem e impulsivo.
Mas ambos estavam entre as pessoas de quem mais gostava no mundo.
Riley já tinha trabalhado com Lucy mais do que uma vez no terreno e sabia que podia contar com ela. A jovem agente de pele e olhos escuros parecia sempre brilhar por dentro, irradiando energia e entusiasmo.
Por contraste, Bill tinha a idade de Riley e apesar dos seus quarenta anos o estarem a tornar um pouco mais lento, ainda era um excelente agente de campo.
Também ainda é um pão, Lembrou a si própria.
Durante alguns instantes pensou – agora que as coisas com Ryan não tinham dado certo, talvez ela e Bill pudessem…?
Mas não, ela sabia que era uma péssima ideia. No passado, ela e Bill tinham feito tentativas desastradas de iniciar algo sério e os resultados tinham sido desastrosos. Bill era um ótimo parceiro e um amigo ainda melhor. Seria uma estupidez estragar isso.
“Bom trabalho,” Disse Bill a Riley, sorrindo abertamente.
“Pois, salvou-me a vida, Agente Paige,” Disse Lucy a rir. “Nem acredito que me deixei atingir. Não o consegui abater quando estava mesmo à minha frente!”
“Isso faz parte do objetivo do sistema,” Disse Bill a Lucy, dando-lhe uma palmadinha nas costas. “Mesmo agentes muito experientes tendem a falhar os seus alvos a curta distância. A RV ajuda a lidar com esse tipo de problema.”
Lucy disse, “Bem, nada como ser atingida por uma bala virtual no ombro para nos ensinar essa lição.” Esfregou o ombro onde o equipamento a tinha atingido com uma ligeira ferroada para que soubesse que tinha sido atingida.
“É melhor do que se for uma real,” Disse Riley. “De qualquer das formas, desejo-te uma rápida recuperação.”
“Obrigada!” Disse Lucy, rindo novamente. “Já me sinto melhor.”
Riley guardou a pistola modelo e apanhou a falsa espingarda de assalto. Lembrou-se do recuo que sentira ao disparar ambas as armas. E o edifício abandonado não existente fora detalhado e realista.
Ainda assim, Riley sentiu-se estranhamente vazia e insatisfeita.
Mas era óbvio que tal não era culpa de Bill ou Lucy. E ela estava grata por eles se terem juntado a ela naquela manhã para aquele exercício.
“Obrigada por concordarem em fazerem isto comigo,” Disse ela. “Acho que precisava de libertar alguma tensão.”
“Sentes-te melhor?” Perguntou Lucy.
“Sim,” Disse Riley.
Não era verdade, mas pensou que uma pequena mentira não faria mal a ninguém.
“E se fôssemos buscar um café?” Perguntou Bill.
“Parece-me uma excelente ideia!” Disse Lucy.
Riley abanou a cabeça.
“Hoje não, obrigada. Fica para outro dia. Vão vocês.”
Bill e Lucy abandonaram a enorme sala de RV. Por um momento, Riley pensou se afinal deveria ir com eles.
Não, seria uma péssima companhia, Pensou.
As palavras de Ryan continuavam a ecoar na sua cabeça…
“Riley, a Jilly foi uma decisão tua.”
O Ryan tinha realmente uma lata monumental para virar as costas à Jilly.
Mas Riley agora não estava zangada. Estava dolorosamente triste.
Mas porquê?
Lentamente percebeu…
Nada é real.
Toda a minha vida, é tudo uma falsidade.
A sua esperança de ter novamente uma família com Ryan e as miúdas havia sido apenas uma ilusão.
Tal como esta maldita simulação.
Caiu de joelhos e começou a soluçar.
Demorou alguns minutos até Riley se recompor. Grata por ninguém a ter visto naquele estado, levantou-se e foi para o seu gabinete. Mal entrou, o telefone começou a tocar.
Ela sabia quem lhe ligava.
Ela esperava aquela chamada.
E sabia que a conversa não ia ser fácil.
CAPÍTULO CINCO
“Olá Riley,” Disse uma voz de mulher quando Riley atendeu a chamada.
Era uma voz doce – trémula e débil com a idade, mas amigável.
“Olá Paula,” Disse Riley. “Como tem passado?”
Paula suspirou.
“Bem, já se sabe – o dia de hoje é sempre difícil.”
Riley compreendia. A filha de Paula, Tilda, tinha sido morta naquele dia há vinte e cinco anos.
“Espero que não se importe que eu ligue,” Disse Paula.
“Claro que não, Paula,” Garantiu-lhe Riley.
No final de contas, Riley tinha iniciado a sua bastante peculiar relação há vários anos. Riley nunca trabalhara no caso do homicídio de Tilda. Entrara em contacto com a mãe da vítima muito depois do caso ser arquivado.
Esta chamada anual entre elas já era um ritual há vários anos.
Riley ainda o considerava estranho, ter aquelas conversas com alguém que não conhecia. Nem sabia qual o aspeto de Paula. Sabia que tinha sessenta e oito anos. Tinha quarenta e três, só três anos mais nova do que Riley, quando a filha fora assassinada. Riley imaginava-a como uma figura de avó carinhosa de cabelo grisalho.
“Como está Justin?” Perguntou Riley.
Riley tinha falado com o marido de Paula algumas vezes, mas nunca o conhecera.
Paula suspirou novamente.
“Faleceu no verão passado.”
“Lamento,” Disse Riley. “Como aconteceu?”
“Foi súbito, repentino. Um aneurisma – ou talvez um ataque cardíaco. Propuseram fazer uma autópsia para determinar a causa. Eu disse, ‘Para quê darem-se ao trabalho?’ Não o ia trazer de volta.”
Riley sentiu pena da mulher. Ela sabia que Tilda fora a sua única filha. A perda do marido não podia ser fácil.
“Como está a lidar com a situação?” Perguntou Riley.
“Um dia de cada vez,” Disse Paula. “É uma solidão agora.”
Havia um traço de insuportável tristeza na sua voz, como se se sentisse pronta a juntar-se ao marido na morte.
Era difícil para Riley imaginar aquela solidão. Sentiu uma enorme gratidão por ter pessoas que se preocupavam na sua vida – April, Gabriela e agora Jilly. Riley tinha suportado o medo de as perder. April estivera em perigo mais do que uma vez.











